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PERSPECTIVAS AO SETORES TÊXTIL E DE CONFECÇÃO COM A REFORMA TRIBUTÁRIA

Texto da PEC 45/2019 aprovado pela Câmara dos Deputados aguarda validação do Senado Federal

Aguardada há mais de 30 anos, a famosa, e clamada, Reforma Tributária está, finalmente, em vias de sair do papel. Com o texto da PEC 45/2019 aprovado em julho pela Câmara dos Deputados, a bola agora está com o Senado Federal, que vem sendo pressionado a ser célere em validar a proposta ainda este ano para que, assim, seja dado início ao processo de transição do regime atual, mais conhecido como “manicômio tributário”, para o novo, que unificará os impostos em uma única base, o Imposto de Valor Agregado (IVA), simplificando a arrecadação.

“A proposta (PEC 45/2019) traz um conjunto de virtudes que, uma vez em vigor, serão benéficas a todos os setores econômicos e aos brasileiros em geral. Teremos no país, enfim, um sistema tributário moderno e que deixará de ser um estorvo no dia a dia de quem paga impostos, não importa quem seja”, disse o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, após a aprovação do texto na Câmara. Ele ainda ressalta que o modelo defendido pela CNI, entidade que há décadas incentiva o governo federal a essa mudança, elimina o principal obstáculo ao crescimento do Brasil de forma sustentada, pois remove travas de investimentos e promove um ambiente de negócios mais favorável ao crescimento das empresas, consequentemente gerando mais empregos e renda aos brasileiros.

Um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) apontou que, se a Reforma Tributária for aprovada, o PIB do Brasil deve crescer 12% em 15 anos. Agora, tente calcular o quanto o país perdeu em ganhos e desenvolvimento nessa espera de décadas.

“A Reforma Tributária não é uma proposta de governo; o país pede. É uma necessidade para nossa economia e produtividade avançarem”, declarou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. “Essa maneira ultrapassada com que os tributos estão organizados atrapalha muito a indústria, o comércio e os serviços. Precisamos despolarizar essa discussão, apartidarizá-la. É um projeto de país que vai beneficiar a todos, uma vitória para nós e para as próximas gerações.”

POSITIVO AO PAÍS E AO NOSSO SETOR

Na visão da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), o texto da PEC 45/2019, da forma como foi aprovado na Câmara dos Deputados, é positivo e, de modo geral, tem seu apoio, contanto que a estrutura do IVA seja preservada, a fim de garantir um bom funcionamento do novo sistema de tributação do consumo.

“A moção de um IVA de boa qualidade, como estabelece a PEC 45, aumentará a competitividade das empresas e, certamente, acelerará o ritmo de crescimento econômico”, afirma Fernando Valente Pimentel, diretor-superintendente e presidente emérito da Abit. “Obvio que qualquer mudança no aspecto tributário traz muitas dúvidas e apreensões, porque cada um analisa seu negócio em particular, o que é legítimo. Mas a discussão sobre a reforma vai ao encontro do interesse maior do país e da indústria, que tem sido a maior penalizada pelo sistema tributário atual, pois paga muito mais impostos do que outras atividades econômicas, como a agricultura, por exemplo.”

Nesse caso, a incidência de impostos é unificada no país e gradualmente reduzida no setor industrial, responsável por 1/3 da arrecadação nacional, e implantada nos setores de bens e serviços, ou seja, no consumo, para que haja equilíbrio.

A economista e professora dos MBAs da Fundação Getulio Vargas, Carla Beni Menezes de Aguiar, destaca que o modelo IVA é adotado em mais de 170 países, como os da União Europeia, por exemplo, e o Brasil acompanharia o padrão internacional. Mas, além disso, é a forma encontrada de modernizar e simplificar o recolhimento dos impostos, gerando maior coerência e transparência em sua incidência.

No caso do Brasil, pretende-se adotar dois IVAs, ou o IVA Dual: um para arrecadação da União, separadamente dos Estados, que é a Contribuição Sobre Bens e Serviços (CBS), em substituição ao PIS, Cofins e IPI, e outro para arrecadação estadual e municipal, o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), em lugar do ICMS e ISS. Lembrando-se de que os impostos serão cobrados somente no destino, não mais na origem, como atualmente.

“Com o novo modelo tributário, a cobrança deve ocorrer apenas sobre o percentual de valor que cada etapa produtiva adicionou a um determinado item. Outro ponto positivo está relacionado aos investimentos, na medida em que os créditos tributários na compra de máquinas e equipamentos, destinados ao aumento da produção, serão padronizados. A indústria se beneficia”, explica Carla.

“O setor de serviços, no meio da cadeia, poderá trabalhar com créditos tributários, e as empresas que usam o regime do Simples não sofrerão alteração. Mesmo que aconteçam eventuais elevações na alíquota de serviços, o crescimento da economia, por meio da melhora no emprego e renda, tende a criar mais receita para o próprio segmento de serviços”, avalia.

Para Pimentel, as principais vantagens vistas no novo modelo tributário são o fim da cumulatividade de impostos, bem como uma garantia e rapidez na restituição dos saldos credores dos dois IVAs, e a simplificação, que tende a desfazer a grande complexidade do atual sistema, além de onerar os custos das empresas, prejudicando sua competitividade. E todas essas camadas de custos, é importante destacar, recaem sobre o preço dos produtos e serviços aos consumidores. Com a reforma, é possível melhorar o custo final dos produtos, aumentar o poder aquisitivo dos consumidores e fazer a economia girar.

“Esse novo modelo, a nosso ver, garante o fim da cumulatividade por meio da criação desses dois IVAs com ampla base de incidência, tributando todos os bens e serviços, e também dá direito a um amplo crédito financeiro, ou seja, todas as aquisições das empresas darão direito a crédito, diferentemente de hoje, com um crédito restrito que impõe diversas limitações à creditação nas aquisições das empresas, com PIS, Cofins e ICMS sendo parcialmente recuperados, enquanto o ISS dos municípios é totalmente irrecuperável. A PEC também garante a desoneração dos investimentos. Hoje, o crédito de ICMS é parcelado em 48 meses; você compra uma máquina e demora 4 anos para recuperar o imposto que estava embutido no preço do equipamento. O empresário tirou dinheiro do bolso, pagou o imposto para algo que não deveria, pois o que deve pagar imposto é o produto gerado pelo bem de capital que você comprou. Além disso, não podemos deixar de esquecer que há incidência de ISS nas contratações de serviços usados na realização dos investimentos, e esse também será objeto de crédito”, pondera.

CRESCIMENTO E COMPETITIVIDADE, AQUI E LÁ FORA

O diretor-superintendente da Abit fala também sobre a importância da rapidez na restituição dos saldos credores, contemplada no texto da PEC, mas que precisa de uma lei complementar para instituir um prazo máximo de ressarcimento desses saldos, bem como centralizar o recolhimento do IBS no Conselho Federativo, com a restituição dos saldos credores das empresas antes da distribuição das receitas aos estados e municípios.

“Essa garantia e a rapidez na restituição são a essência do IVA em todos os países que utilizam esse modelo. Sem essas condições asseguradas, o imposto não funciona; então, é fundamental que o Senado preserve a espinha dorsal do modelo IVA criado pela PEC 45.”

Pimentel ressalta que o Brasil, hoje, é exportador de impostos e, com o fim da cumulatividade e a rápida restituição dos saldos, haverá uma desoneração completa das exportações, fazendo com que o país se torne mais competitivo lá fora e os produtos brasileiros possam concorrer em condições equânimes no mercado externo. Isso abriria muitas possibilidades ao nosso setor têxtil e confeccionista.

UNIFORMIDADE DE ALÍQUOTAS

Este é um ponto importante da Reforma Tributária para colocar fim à guerra fiscal entre os estados: a uniformidade das alíquotas de ICMS, que também desonera toda a cadeia produtiva e contribui para reduzir as desigualdades regionais. A PEC 45/2019 prevê a criação do Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR), que atuará exclusivamente com recursos da União.

“Esse fundo, pelo olhar da Abit, é o mecanismo mais eficiente para a promoção do crescimento das regiões menos desenvolvidas em substituição aos atuais incentivos de ICMS, estes que, por serem concedidos por todos os estados, inclusive os mais ricos, não têm mostrado resultados satisfatórios em termos de desconcentração regional da produção industrial”, opina Pimentel.

Ele ainda lembra que conforme uma lei de 2017, a PEC preserva os atuais incentivos de ICMS com validade até 2032, e o FDR, segundo o texto, entraria em vigor a partir de 2029, quando as alíquotas de ICMS começariam a ser equilibradas. “Essa redução dos incentivos será compensada pela criação do Fundo de Compensação de Benefícios Fiscais ou Financeiros-fiscais, com aportes da União e funcionamento entre 2025 e 2032, último ano de vigência dos atuais incentivos do ICMS. Na transição do ICMS, sua alíquota será reduzida 10% ao ano a partir de 2029, de forma que a potência dos incentivos atuais seja reduzida gradativamente até 2032”, explica.

UM AMÉM, MAS NÃO PARA TUDO

Mesmo com os benefícios superando majoritariamente, o texto da PEC 24/2019 merece atenção em pontos que, se não tratados de forma mais clara, podem “melar” a reforma tributária.

Na opinião da economista Carla Beni, o primeiro ponto está na lista de exceções, que pode vir a produzir uma alíquota de IVA elevada como mecanismo compensatório. O outro, que precisa ser mais bem trabalhado, é o da concorrência desleal com o e-commerce internacional.

Pimentel concorda com esses pontos e insere mais alguns que merecem atenção, como eliminar do texto alguma possibilidade de novas contribuições estaduais e vedar a incidência de imposto seletivo sobre todos os insumos da cadeia produtiva. Ele explica seu ponto de vista:

“A introdução de exceções adicionais, como foi feita no projeto que veio da Câmara, além de aumentar a alíquota-padrão reduz a neutralidade do modelo, o que é uma das principais características do IVA. Quanto maior o número de exceções, maior será a alíquota-padrão do IBS e do CBS incidente sobre os demais bens e serviços, e menores serão os ganhos em termos de simplificação e redução de litigiosidade, drenando o potencial da Reforma Tributária quanto à aceleração de crescimento.”

No caso da incidência de imposto seletivo sobre todos os insumos da cadeia produtiva, o diretor-superintendente da Abit é enfático em dizer que o Senado precisa vedar essa possibilidade; caso contrário, prejudicará o âmago da Reforma Tributária e os impactos positivos que esperam ser trazidos pelo novo modelo. “Há de se observar agora todas as leis complementares que serão debatidas e aprovadas nos próximos anos, visto que a reforma só começará a ser implementada em 2025”, alerta a economista da FGV.

“PERDEMOS A CHANCE, DE FATO, DE SIMPLIFICAR O SISTEMA TRIBUTÁRIO ”

Esta afirmação vem do consultor tributário e CEO da Tax Strategy, Hélder Santos, referindo-se sobre a recente sanção do PLP 178/21, que pretende simplificar e desburocratizar o sistema tributário brasileiro. Segundo o especialista, na sua versão original, o PLP 178/21 tinha grande potencial de amenizar os custos de conformidade suportados pelos contribuintes e, em contrapartida, aprimorar a capacidade de fiscalização do governo. No entanto, quando sancionado, o projeto, transformado em Lei Complementar que deu origem ao chamado Comitê Nacional de Simplificação de Obrigações Tributárias Acessórias (CNSOA), teve 11 vetos importantes do presidente Lula. Um deles é referente à Nota Fiscal Brasileira Eletrônica (NFB-e), que substituiria vários documentos por um único modelo nacional. Para o consultor, o Brasil perdeu uma grande chance de simplificar, de fato, o sistema tributário brasileiro. “Parece que temos um grande legado dessa burocracia tributária sustentando um sistema complexo e ineficiente ao contribuinte e à fiscalização, sendo que a justificativa para sua manutenção contradiz estudos e pesquisas nacionais e internacionais. Precisamos modernizar a área tributária de forma a reduzir custos de conformidade para ambos os lados, proporcionando melhores condições para o desenvolvimento econômico e social do país”, avalia Hélder.
Apesar das críticas, o consultor destaca que a lei é um avanço que pode melhorar o ambiente de negócios no Brasil, padronizando parte das legislações e sistemas. “Devemos ter alguma redução de custos, mas nada perto do que se esperava se o projeto tivesse sido sancionado na sua integralidade”, aponta Hélder.

(ABERTURA) Ilustração: Tainã Alves

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