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INDÚSTRIA TÊXTIL GANHA MAIS UMA ALIADA NO COMBATE À COVID-19

Empresa brasileira de nanotecnologia criou composto que age diretamente sobre o SarS-CoV-2 e com eficácia comprovada

Na guerra contra o coronavírus, especificamente o SarS-CoV-2, causador da Covid-19, quanto mais armas tivermos para nos municiar enquanto uma vacina ou tratamento eficaz não aparecem, melhor. 

E a indústria têxtil e de confecção brasileira ganhou mais uma aliada nesse quesito, podendo levar maior proteção aos usuários e consumidores por meio de suas fibras e tecidos. É que a Nanox, empresa de nanotecnologia sediada em São Carlos, interior de São Paulo, trouxe ao mercado uma novíssima versão da Ag+Fresh, uma solução à base de íons de prata que começou a ser estudada em 2017 e foi disponibilizada comercialmente há cerca de 1 ano e meio. Mas a nova versão, reformulada, age diretamente sobre o vírus da Covid-19 em bases têxteis, com eficácia de 99,9% comprovada e certificada. 

Para saber mais sobre este lançamento, Costura Perfeita conversou com Guilherme Tremiliosi, bacharel em Química e mestre em Ciências, Química e Física pela Universidade de São Paulo (USP), Gerente de Produtos e líder do projeto na área têxtil dentro da Nanox. Vale destacar que Guilherme também já atuou numa grande empresa da indústria têxtil nacional. Confira a entrevista a seguir.

Costura Perfeita: Em quanto tempo a Nanox conseguiu desenvolver o acabamento para têxteis capaz de eliminar o vírus da Covid-19? Como foi o processo de desenvolvimento?

Guilherme Tremiliosi: Esse produto é fruto de um desenvolvimento que começamos em janeiro de 2017, já são mais de 3 anos trabalhando nesse material. A princípio, foi pensado para ser um antibacteriano e antifúngico, até pelo fato de as propriedades antivirais não estarem em evidência como agora. Então, devido a pandemia, iniciou-se estudos acerca de propriedades antivírus. No começo da pandemia, identificamos que, de acordo com a literatura técnica e trabalhos publicados no meio científico e acadêmico, nosso produto tinha um bom potencial para eliminar o vírus da Covid-19, uma vez que trabalhos com produtos similares ao nosso, com o mesmo princípio ativo – a prata -, mostraram esse metal nobre como um agente ímpar para a eliminação de diversos vírus – envelopados e não envelopados, como o Sars-CoV-2. A estratégia da Nanox, ao invés de provar que nosso produto elimina apenas um vírus genérico, foi focar no principal problema: o vírus da Covid-19. Então, entramos em contato com laboratórios do Brasil e do mundo, cerca de 30 unidades nos 5 continentes, para fazer o teste da eficácia do nosso produto frente ao Sars-CoV-2. Porém, não existem laboratórios comerciais no mundo que podem fazer esse tipo de teste e emitir um laudo. Portanto, decidimos partir de um trabalho mais acadêmico. Nessa decisão, fizemos a parceria com o ICB-USP (Instituto de Ciências Biomédicas), pois sabíamos que tinham acesso ao vírus, uma vez que foram os primeiros a isolar e mapear esse vírus no Brasil. Os testes como nosso material foram com o vírus isolado dos primeiros pacientes do Hospital Israelita Albert Einstein, onde enviamos uma série de amostras, não apenas tecidos, mas produtos plásticos, cerâmica e outros tipos. O tecido aditivado com nosso produto, por conta de uma facilidade operacional, foi o primeiro a passar pela bateria de testes, os demais estão em processo; assim, em breve teremos resultados. Sobre a bateria de testes do tecido aditivado, após algumas etapas onde já tinha sido possível identificar o potencial do nosso produto, foi determinado o time de experimento adequado, baseado em uma norma, para que pudesse comprovar a eficiência frente ao vírus da Covid-19. Após essa determinação, o teste foi replicado com dois laboratórios independentes, com pessoas executando testes independentes (chamamos de “teste cego”) e, então, os resultados foram validados, já que cada teste obteve o resultado similar ao outro. 

CP – Além do ICB-USP, com quais outros centros de pesquisa fizeram parceria para este desenvolvimento? E qual a importância de ter centros capacitados e investimentos em polos científicos como estes para o avanço da indústria? 

GT: A parceria com o ICB-USP foi iniciada no final de fevereiro deste ano, sendo que apenas no final de maio pudemos ter acesso aos resultados e comunicar ao mercado e à sociedade. Sobre as demais parcerias, a Nanox é spin-off do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF) da UFSCar, que é um centro de pesquisa referência da FAPESP. Inclusive, o diretor do CDMF, Prof. Dr. Elson Longo, foi orientador dos diretores da Nanox. Ainda na influência das universidades públicas, eu, Guilherme, construí minha vida acadêmica na USP. Esse destaque para o meio acadêmico vai de encontro com o propósito da Nanox, até por ser uma empresa altamente tecnológica, que tem em seu escopo a realização constante de pesquisas e desenvolvimentos, e precisamos utilizar a estrutura das universidades para trabalhar nossos produtos. Assim, parcerias com o ICB e a Universitat Jaume I (Espanha), são consequência desse relacionamento íntimo que temos com a UFSCar, USP, UNESP, UFRN e outras universidades brasileiras, europeias e americanas. Toda essa relação é significativamente importante no reflexo das próprias universidades, da atividade de pesquisa e desenvolvimento, tanto para nossa sociedade quanto para a imagem do Brasil mundo afora.

AG+FRESH, da Nanox: composto age diretamente sobre o SarS-CoV-2 em bases têxteis.
Fotos: Divulgação

CP – A Ag+Fresh já tem patente registrada? 

GT: A Ag+Fresh é apenas uma das diversas tecnologias da Nanox que estão no mercado. São 3 linhas de produtos – cerca de 50 soluções -, das quais todas com características de aditivos para combate a microrganismos como fungos e bactérias. Porém, no momento, apenas essa solução para acabamento têxtil foi comprovada no combate ao novo coronavírus. A marca já foi registrada, a patente já depositada nos EUA. Todo o processo de resguardo do produto já foi validado pela empresa.

CP – O que o acabamento criado pela Nanox traz como diferencial frente a outros acabamentos antivirais e antibacterianos que já estavam no mercado e os recém-lançados no Brasil? 

GT: O grande diferencial do nosso acabamento é ser o único testado, especificamente, frente ao vírus da Covid-19, o Sars-CoV-2, causador da Síndrome Respiratória Aguda Grave. Os demais produtos lançados no Brasil foram testados frente a vírus genéricos. A exemplo, há acabamentos que foram testados com o coronavírus I (Mers-CoV), causador da Síndrome Respiratória do Oriente Médio, e há outros que foram testados com vírus genéricos (envelopados ou não envelopados). Algumas divulgações, inclusive, sugerem que se aprovados frente a esses tipos de vírus, podem ser eficientes contra o vírus da Covid-19, o que, de fato, é preocupante no sentido da mensagem que passa à sociedade, logo, aos consumidores. Outro diferencial é que, mesmo por um momento deixando a relevância do tipo de vírus, o nosso produto comprovou a inibição de 99,99% do vírus em apenas 2 (dois) minutos.

CP – Como funciona o processo de impregnação do acabamento? Pode ser aplicado em qualquer tipo de fibra ou mesclas? 

GT: O processo é feito pelo método pad-dry-cure (imersão-secagem-fixação), comum na indústria têxtil. Fizemos todo o nosso desenvolvimento baseado nesse processo de aplicação do nosso material no tecido, pois está amplamente disponível no mercado, praticamente todas as tecelagens o utilizam em linha para aplicação de acabamento.

CP – Qual o tempo de duração do poder protetivo no tecido? 

GT: O efeito do produto como bactericida e fungicida passou por teste de lavagem caseira, em máquina sem temperatura, durando 30 ciclos. Também testamos, conforme instruções da Anvisa, em lavagem com cloro. Ainda assim, a propriedade antimicrobiana se manteve. Dessa forma, acreditamos que vai se manter com a propriedade virucida também, finalidade que ainda está sendo testada.

CP – Em quanto tempo o acabamento inativa/elimina o vírus da Covid-19 do tecido?

GT: Primeiramente, é importante compreender a lógica do teste, que é feito com 3 tubos: num deles é inserida uma solução com vírus e células, apenas. Em outro, com essa mesma solução, é acrescentando um pedaço de tecido com um tamanho padrão para absorção homogênea dessa solução, ficando, assim, em contato íntimo com o tecido. No terceiro tubo, se repete o procedimento do último, porém, com tecido com o nosso acabamento antiviral. Essas 3 soluções preparadas se mantêm por um tempo determinado para, então, ser coletadas alíquotas para medir a quantidade de vírus antes e depois. Assim, foram 2 coletas de alíquotas, uma com 2 minutos de contato e outra com 5 minutos, sendo que no menor tempo já apresentou redução de 99,99% dos vírus nas soluções onde estavam o tecido com acabamento. Um detalhe importante, é que o tecido sem acabamento também é capaz de eliminar o vírus, assim como qualquer outra superfície, já que o vírus, sem replicar, tem uma “vida” limitada, obviamente, variando de acordo com o material dessa superfície. No caso do tecido, o vírus pode ficar ativo ou “vivo” entre 24 a 48 horas, diferente de bactérias e fungos que se multiplicam sem a necessidade de se hospedar em outra célula, necessitando de um agente químico para sua eliminação.

CP – Vocês estão testando o acabamento em outros materiais, como couro, laminados, borracha, para uso também em calçados e móveis?

GT: Sim. A Nanox é uma empresa especializada em tecnologia antimicrobiana. O têxtil é apenas uma de nossas frentes de atuação. Temos produtos para aplicação em couro, em acabamentos de madeira, em tintas, plástico (utilidade doméstica, linha branca, embalagens de alimentos). Atuamos, praticamente, em todos os segmentos de mercado. Mas, para o combate ao coronavírus, apenas o acabamento têxtil tem seu teste concluído.

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