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DESAFIOS AO SETOR TÊXTIL E CONFECCIONISTA BRASILEIRO EM 2022

Como os cenários político-econômicos, logísticos e de conflitos internacionais podem afetar o andamento da indústria nacional

Haja coração ou sangue frio para atravessar 2022! Quando parecia que a pandemia daria uma arrefecida, novas variantes mais contaminantes surgiram – mas graças à vacinação, de forma mais branda e menos letais –, lembrando-nos de que teremos que conviver com a Covid-19 no mundo por tempo indeterminado. A economia, aqui e lá fora, também não anda lá uma maravilha: no Brasil, ainda temos o agravante da alta dos juros, inflação e ano eleitoral de disputa presidencial, em que o ato de governar fica para escanteio em prol da campanha para uma reeleição ou posição de poder nas cadeiras do senado.

E o que isso implica nos setores têxtil e confeccionista? Muita coisa. Do preço e fornecimento de insumos à falta de previsibilidade para um forecast mais assertivo, passando pelo comportamento dos consumidores com poder de compra retraído.

“Todo ano eleitoral é sempre mais ruidoso, traz sempre mais apreensões, principalmente quando a campanha já está nas ruas. Então, sem dúvida nenhuma, cada declaração dos candidatos traz reações ao mercado, positivas ou negativas”, pontua Fernando Pimentel, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), que emenda: “só que este ano a campanha vem junto com a pandemia, que ainda não acabou, lockdown na China, guerra entre Rússia e Ucrânia, são diversos fatores trazendo muita volatilidade e, com certeza, impactando o custo de matérias-primas e, consequentemente, das empresas. Porém, não é possível repassar tudo ao consumidor, que também está pressionado pelos aumentos de preços de itens essenciais, como gás, energia, combustível.”

Fernando Pimentel, presidente da Abit./ Divulgação

Com a taxa Selic na casa dos 12% para 2022, a tomada de crédito e os pagamentos em dia também precisam de uma ginástica por parte das empresas e dos consumidores. Na opinião do presidente da Abit, este é um ano com baixa capacidade de previsão em relação a prazos mais alongados, o que dificulta a gestão dos negócios.

“As empresas estão muito pressionadas pelos custos, sem capacidade de repassá-los e, ao mesmo tempo, com grande expectativa para as vendas de inverno, esperançosas de que o clima seja bem definido para não transbordar para as coleções de primavera-verão. Isso sem deixar de pensar nas variáveis do mercado se alternando de forma intensa, dificultando a previsibilidade e o capital de giro em caixa. A economia já está andando de lado na ponta do consumo, como consequência da escalada dos preços. É preciso considerar que a Selic mais elevada também pressiona as contas públicas, criando um círculo vicioso. Por tudo isso entendemos não haver necessidade de uma nova subida da taxa”, conclui o presidente da Abit.

Ele ainda traz à luz a questão das reformas administrativa e tributária, que a despeito do ano eleitoral não devem ser travadas, mais uma vez. Pimentel afirma que a conclusão das duas reformas de modo assertivo sinalizaria a possibilidade de um Estado mais eficaz, capaz de suprir de modo adequado as áreas prioritárias da saúde, educação e segurança, bem como estimularia investimentos, criando condições mais favoráveis à retomada econômica. “Seriam reduzidos, de imediato, o grau de insegurança jurídica e os temores de que o Brasil siga fazendo do empreendedorismo uma corrida de obstáculos, fator tão nocivo à nossa economia.”

O presidente da Abit salienta que a reforma tributária precisa simplificar o sistema, extinguir as assimetrias interssetoriais e ampliar a base de contribuintes. Lembre-se de que a indústria de transformação paga impostos de modo desproporcional, pois representa 11% do PIB, mas responde por 24% da arrecadação federal e 20,8% da previdenciária patronal. “É preciso corrigir esse tipo de distorção”, afirma.

Pimentel também acentua que a reforma tributária, se realizada de modo adequado, estimula maior formalização da economia. Para esse avanço, há duas medidas decisivas: a primeira é reduzir alíquotas, desestimulando a sonegação e incentivando a legalização. “Aliás, destinando menos dinheiro ao Estado, as empresas investem, ampliam a produção e pagam mais impostos. A receita fiscal cresce. A segunda providência diz respeito à necessidade de a reforma transcender à economia analógica, abrangendo também a digital, o que incluirá a taxação de numerosas atividades hoje informais. Isso também pode reduzir a carga de cada contribuinte e ampliar a arrecadação total.”

Para este ano, a Abit espera um ligeiro crescimento no setor, entre 0,5% e 1%, acompanhando a média do PIB. Em 2021, o faturamento foi de US$ 194 bilhões.

MAIS INCERTEZAS AO QUE JÁ ESTAVA INCERTO

Logo em fevereiro deste ano, uma bomba, literalmente, estourou: a invasão da Ucrânia pela Rússia, numa guerra que parece saída de um surto psicótico do presidente russo, sem um motivo concreto, mas com efeitos bem reais, que já estão sendo sentidos.

“Há quem diga que estamos vivendo no mundo “3V”: variantes variando violentamente, o que exige muito mais dos gestores e da sociedade para dar conta dos desafios que temos pela frente”, diz Pimentel.

“Aumento nos preços de petróleo, algodão, soja, milho, trigo, minérios de ferro, tudo isso está dentro do contexto de guerra, pandemia, lacração de portos, dificuldade de transporte, fretes muito altos, lockdowns em Xangai (nada menos que o principal centro comercial, industrial e portuário da China), agora juros mais altos, então, o cenário tem muitas variáveis complicadas. A guerra foi mais um componente afetando insumos importantes para a cadeia produtiva, gerando a paralisação de fábricas de semicondutores, por exemplo, e a inflação, que é mundial, ameaçando uma “estagflação”, o que seria o pior dos mundos”, analisa.

Daniel Mota, consultor e professor dos cursos de Logística da Fundação Vanzolini, reforça que, por todos os fatores já citados, existe um efeito generalizado de precaução e redução de mercado, incluindo o dólar, que, apesar de ter baixado pouco, ainda continua interessante para a exportação, fazendo com que os preços de itens básicos por aqui, como o de alimentos, combustível e mesmo o algodão, permaneçam elevados.

“Nesse rescaldo de pandemia, com a guerra fazendo com que as cadeias de suprimentos sejam remanejadas e/ou restabelecidas, com o combustível mais caro, o frete mais caro, realmente cria uma situação muito incerta a todos os segmentos que estão sofrendo no momento. O grande risco, porém, está no que vai acontecer nos próximos anos: como serão 2023 e 2024 é a grande incógnita. Esperamos que sejam anos de restabelecer a ordem, que o dólar e o preço dos combustíveis voltem para o lugar, e a inflação também”, avalia.   

Na visão de Pimentel, a indústria têxtil brasileira tem resiliência, capacidade, é grande protagonista na geração de empregos (hoje é cerca de 1,3 milhão de pessoas) e renda, tem investido em inovação, sustentabilidade e diversidade, mas tem que trabalhar a agenda industrial, na qual está inserida.

“O mundo está redescobrindo a industrialização e sua importância. Não será uma reindustrialização como na década de 1970, mas pautada na agenda ESG, bioeconomia, no consumo consciente, na inovação e na tecnologia. É um novo processo que exigirá um grande empenho na educação, na formação de pessoas, na requalificação, de maneira que entremos numa rota virtuosa à medida que haja uma acomodação nos conflitos atuais, como a guerra e a Covid-19.”

LOGÍSTICA

Em meio à “crise dos contêineres”, a maior crise portuária em 65 anos, detonada pela pandemia, o valor do frete marítimo disparou com a demanda maior que a oferta, chegando a US$ 15,58 no dia 16 de setembro de 2021 (full container) partindo de Xangai, enquanto em abril do mesmo ano bateu em US$ 3,19.

Rafael Dantas, diretor de vendas da Asia Shipping. / Divulgação

Mas, de acordo com Rafael Dantas, diretor de vendas da Asia Shipping, multinacional brasileira com sede em Santos (SP), atuante na gestão de processos logísticos (importação e exportação) por diversos modais, o frete de importação está estabilizado – apesar de alto –, e o que vai determinar seu preço e a quantidade de espaço é uma manobra utilizada por armadores desde 2019 para reduzir a capacidade do mercado: a blank sailing, ou seja, o armador resolve modificar a rota fazendo a suspensão (omissão) da atracação do navio em um porto específico ou cancelando a viagem inteira e, dessa forma, pressionando os preços. A questão do petróleo, diz Dantas, interfere mais no transporte aéreo.

“Já o fornecimento de insumos pode continuar sendo um problema, já que a China está com a política de Covid Zero”, ressalta, e traz alternativas para evitar surpresas com atrasos em 2022.

“A primeira delas é diversificar os serviços utilizados para importar da China, hoje principal fornecedor de insumos têxteis para o Brasil. Justamente por a Asia Shipping ser um dos maiores clientes dos principais armadores, conseguimos ajustar de maneira inteligente essa estratégia, aliada à necessidade de cada cliente.”

Hoje a empresa, fundada em 1996, está presente em 11 países, com 39 escritórios pelo mundo, sendo a maior integradora logística da América Latina.

DRIBLANDO OBSTÁCULOS COM GESTÃO E INTELIGÊNCIA DE MERCADO

Se há um setor bastante sensível a sazonalidades é o têxtil, mas também, como já dito por Fernando Pimentel, bastante resiliente, tendo passado, ao longo de décadas, pelas situações mais adversas, e se reinventando.

Na opinião do economista e especialista em sistemas ERP, William Ribeiro, que também é sócio da Golive Consultoria, empresa parceira da global SAP B1 para o segmento de moda, o empresário brasileiro saberá como contornar os problemas mais impactantes, mitigando os maiores riscos ao negócio.

Para tanto, ele dá exemplos de como alguns processos podem ajudar a passar por este momento e sair ainda mais fortalecido ao final dele:

  • Gestão eficiente: Realizar uma gestão eficiente da empresa e principalmente da cadeia produtiva, pode e deve auxiliar nas reduções de custos, aumentando as margens dos produtos vendidos e, consequentemente, a saúde financeira da empresa. Além, é claro, de identificar os gargalos dos processos de produção e logística, bem como reduzir os prazos de entrega.
  • Procura constante de inovações: com o crescente aumento da concorrência e desafios relativos à cadeia de suprimentos, é preciso se diferenciar cada dia mais no mercado, e o processo de inovação é uma das melhores armas para isso. Inovar em novas matérias-primas, novos processos, novas campanhas de marketing, entre outros.
  • Investimento em tecnologia: fundamental atualmente e no futuro, a tecnologia evolui de forma muito rápida e traz infindáveis benefícios às empresas e aos colaboradores, tornando-os mais eficientes. Investir nas melhores ferramentas e sistemas de gestão do mercado é garantia de alavancagem nos resultados da empresa, reduzindo custos operacionais, aumentando a produtividade e garantindo uma melhor entrega ao cliente final. A solução da SAP, B1 Moda, consegue atingir os 3 pilares, ajudando a entregar inovação, gestão eficiente com compliance e a melhor tecnologia e custo-benefício do mercado.

Recém-chegada ao Brasil, a solução SAP B1 Moda é uma ferramenta da SAP, líder global em desenvolvimento de sistemas de gestão, presente nas maiores empresas do mundo. Voltada especificamente para resolver as “dores” das confecções, sejam de grande, médio ou pequeno porte, a B1 Moda contempla o gerenciamento e a programação de matérias-primas, grades, entregas, resolvendo as rupturas na distribuição, podendo alcançar até os processos da ponta, como lojas físicas e e-commerces, caso o cliente possua essa demanda.

“Obviamente, quem detiver a capacidade de controle do planejamento de recursos, além de ferramentas de análises preditivas, tecnologia de ponta e otimização de seus processos, será menos afetado”, pondera William.

AS OPORTUNIDADES DO BRASIL NO NOVO CENÁRIO GEOPOLÍTICO

Na visão de Fernando Pimentel, presidente da Abit, o cenário delineado pela invasão da Rússia à Ucrânia e pelos efeitos da pandemia indica que a chamada hiperglobalização pode ter um arrefecimento. Para ele, em meio às transformações geopolíticas e seus efeitos no equilíbrio internacional e nas alianças entre nações e blocos, o Brasil tem ótimas oportunidades de estabelecer novas relações comerciais, contemplando a agenda da diversidade e da sustentabilidade econômica, social e ambiental.

“Crises, principalmente as relativas às guerras e surtos de doenças, são muito dolorosas, causando irreparáveis perdas. Assim, no seu rescaldo é fundamental que, pelo menos, aprendamos as lições. Nesse sentido, alguns países estão levando novamente a indústria para dentro de suas fronteiras, num movimento inverso ao que fizeram no advento da hiperglobalização nas duas últimas décadas do século XX. Adotam a medida para garantir a segurança alimentar o suprimento nas cadeias produtivas mais estratégicas e a integridade das telecomunicações e da cibernética. Nesse contexto, o Brasil tem um terreno muito fértil para desenvolver uma política industrial moderna e avançada, alinhada às demandas suscitadas pelas transformações do mundo. Um exemplo é o aparato têxtil, que inclui, entre outros, os técnicos e os tecnológicos, com aplicação em várias indústrias, como a eólica, de geotêxteis, infraestrutura e de fardamentos. Há todo um espaço de integração com os polos que vão se consolidando no desenho geopolítico internacional, como o das Américas, o da Europa e o da Ásia”, diz.

A ideia, segundo Pimentel, é promover uma reinserção do Brasil na economia global, considerando as transformações dos polos geopolíticos, mas sem discriminar ninguém. Nesse processo, a indústria têxtil e de confecção, que é planetária e de alta concorrência, poderá criar, nas Américas, um cluster muito relevante, abrangendo não apenas o segmento de vestuário, cama, mesa e banho, mas também o tecnológico, que atende às áreas de saúde, energia, militar, esportes, mobilidade e várias outras aplicações. Para ele, este é apenas um bom exemplo do potencial da manufatura de contribuir para a retomada do crescimento econômico e para reposicionar nosso país como protagonista na nova geopolítica internacional.
“Alguns acreditam que o único fator para que a indústria brasileira se torne mais dinâmica seja a abertura unilateral. Discordo dessa tese, principalmente devido ao grande abismo, sintetizado pelo “custo Brasil”, que temos em relação às vantagens competitivas de numerosas nações. Porém, acredito e considero necessários um novo movimento de integração, a ativação de acordos como o do Mercosul com a União Europeia e as relações bilaterais com os Estados Unidos, Canadá e outras nações e blocos.”

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